O Inglês na América – a influência dos irlandeses
A Ilha Esmeralda, a Irlanda, ocupa um lugar quase místico no mundo da língua inglesa. Há uma certa musicalidade na voz irlandesa realmente gostosa de ouvir e que é admirada pelos demais nativos do idioma quer sejam americanos, ingleses, australianos, ou outros. Ironia do destino. Nos primórdios da língua inglesa, quando os anglo-saxões invadiram a Inglaterra e derrotaram os celtas, os idiomas dos dois povos não se misturaram. Já na Irlanda, onde os celtas continuaram, a confluência das duas culturas resultou numa forma de expressão, escrita e falada, que é considerada uma das glórias do idioma inglês. É como se os irlandeses quisessem se vingar dos ingleses elevando o idioma deles a níveis extraordinários. Veja: entre os maiores nomes da literatura em língua inglesa encontram-se Jonathan Swift, Richard Sheridan, Oscar Wilde, W. B. Yeats, William Synge, George Bernard Shaw, James Joyce, Samuel Beckett e muitos outros – todos irlandeses.
(da esquerda para a direita)
Isso não quer dizer que os irlandeses tenham esquecido que sua soberania foi espezinhada, que muito sangue irlandês foi derramado por exércitos ingleses durante mais de 800 anos. Desde a primeira invasão da Irlanda pelos ingleses em 1171, a língua gaélica irlandesa e a língua inglesa têm sido adversárias numa guerra nem sempre muda em que, durante muitos anos, a gaélica saiu vencedora, até mesmo quando o governo inglês tentou impor o seu idioma através de decretos. O confronto não era apenas político, como ficou bem claro no século XVI quando a Igreja Católica apoiou o gaélico católico contra o inglês protestante. Anos depois, os aspectos religiosos ficaram ainda mais evidentes quando o rei James I ordenou a invasão da província de Ulster. Um embate que parece não ter fim; com frequência, os noticiários ainda falam da inimizade entre os protestantes e católicos na Irlanda do Norte, em que os irlandeses são representados pelo IRA (Exército Irlandês Republicano) e a Coroa pelo exército inglês e por adeptos da união com a Inglaterra.
Foi precisamente a partir da ocupação de Ulster, que os irlandeses começaram a abandonar a sua terra, numa outra virada irônica da história – com o correr to tempo, foram eles que mais espalharam a língua de seus opressores pelos mais diversos pontos do globo, como Terra Nova, América, Barbados, Austrália e outros. Para eles, o Novo Mundo era a terra da eterna juventude, da renovação, e por isso estavam entre os primeiros a chegar às colônias inglesas, quase todos contratados como serviçais. O êxodo continuou cada vez mais intenso.
Algumas das características do inglês falado na Irlanda naquela época naturalmente passaram para o inglês do Novo Mundo. Por exemplo, quando um americano diz I seen, querendo dizer I saw (eu vi), ou quando se ouve /beleive/ (lido em português) em vez de /bilive/, referindo-se ao verbo believe (crer, acreditar) você pode estar certo de que há um toque irlandês no ar. E novamente vamos encontrar o plural de you, youse, influenciado pelo gaélico e que ainda hoje é ouvido nas ruas de Nova York e Boston.
Por tradição, os irlandeses eram trabalhadores braçais, serviçais ou soldados, gente bastante humilde. A palavra shanty (do gaélico sean tig, casa velha) referia-se aos barracos construídos pelos trabalhadores ao longo da estrada de ferro transcontinental que estava sendo construída. Mais tarde, shantytown veio a ter o significado de favela, e o termo pejorativo shanty Irish era aplicado em Boston às famílias irlandesas como a dos Kennedy, cujo chefe, Patrick Kennedy, chegou em 1848 sem um tostão no bolso e começou a trabalhar numa fábrica de barris.
Aos poucos, os irlandeses foram-se firmando em vários setores da sociedade americana. Na América, como na Inglaterra, eles ocupam uma posição importante na tradição literária. Dois dos maiores escritores americanos são de origem irlandesa – F. Scott Fitzgerald e Eugene O’Neill. Na política e no movimento trabalhista, eles também se destacaram, especialmente em cidades como New York, Boston, Chicago e outras. A forte presença na vida política americana é exemplificada por John F. Kennedy, Richard Nixon e Ronald Reagan, todos descendentes de imigrantes irlandeses.
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O inglês, depois de longas viagens, chegou às praias atlânticas do Novo Mundo vindo de tantos lugares, por tantos motivos, e sujeito a tantas influências – brancas, morenas, louras, negras e vermelhas – que o inevitável resultado seria uma língua diferente daquela falada nas ruas de Londres. Foi assim que nasceu o inglês americano, que agora iria se enriquecer e se espalhar pelo continente numa trajetória que o levaria às praias do Oceano Pacífico.
O texto acima faz parte do livro Once Upon a Time um Inglês… A história, os truques e os tiques do idioma mais falado do planeta escrito por John D. Godinho. Adquira essa obra nos seguintes endereços: |
Semelhanças e diferenças entre inglês britânico e inglês americano
Inglês na América: formação e descolonização do inglês americano
Inglês na América: contribuição vocabular de antigas potências europeias
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