O certo e o errado em inglês: arbitrariedades dos guardiões do idioma
Parece que os interesses entrincheirados não querem abrir mão do mercado da gramática normativa. É o que dizem alguns linguistas para explicar o que está ocorrendo, e dão exemplos: muitas das expressões censuradas pelos “guardiões” vêm da época de Shakespeare, e até antes, mas não tiveram a sorte de serem incluídas nos padrões linguísticos das camadas com poder econômico, intelectual ou político. Ainda hoje, os professores de inglês se veem na obrigação de censurar expressões como: aks a question (asks a question – faz uma pergunta); workin’ (working – trabalhando); ain’t (am not, is not, are not, has not, have not, etc. – não sou, não é, não são, não tem, não têm etc.); I don’t see nothing (I don’t see anything – Não vejo nada); he don’t (he doesn’t – ele não…); them things (those things – essas coisas); we was (we were – eramos, fomos); e conjugações no passado tais como drug em vez de dragged (arrastar), seen (saw – ver), clumb (climbed – galgar, subir), drownded (drowned – afogar), growed (grew – crescer, cultivar) e muitas outras.
Mais Arbitrariedades dos “Guardiões” do Inglês
A tendência do inglês ao longo dos séculos é simplificar. Por isso, não seria de estranhar que “he don’t” fosse reconhecido como padrão, acompanhando suas primas, as contrações I don’t, you don’t, we don’t, etc. Nada disso. Os puristas insistem na forma he doesn’t. Outro exemplo é o verbo to be no passado. Se você diz I ate, you ate, he/she ate (eu comi, tu comeste, ele/ela comeu), em que só o sujeito muda, porque não pode dizer I was, you was, he/she was? Não pode. O padrão é I was, you were, he/she was? Por quê? Ninguém sabe.
Nenhum dos “guardiões” questiona o fato de que o inglês padrão não distingue o you singular do you plural. Antigamente, havia a segunda pessoa singular, thou, como em thou eatest (tu comes). Hoje ambas as formas são, simplesmente, you. Mas a necessidade da distinção ainda existe. É por isso que muitas vezes você ouve no inglês não-padrão as palavras y’all (contração de you all) e youse, querendo dizer “vocês”, o que na opinião de muitos é superior ao inglês padrão. Aliás, y’all é bastante comum no sul dos Estados Unidos. Na abertura dos Jogos Olímpicos de Atlanta, havia um letreiro gigantesco com os dizeres How y’all doin’? querendo dizer “Como estão todos vocês?” (How are you all doing?). Pela sequência de erros, os puristas devem ter ficado com vontade de se jogar na pira olímpica.
Mas até os mais críticos concordam que a existência de normas é mais do que razoável para facilitar a comunicação, não só falada mas, sobretudo, escrita. O standard English é apenas um entre os vários tipos de inglês, mas é o que serve de padrão e é ensinado nas escolas e em cursos de idiomas. E daí surge um problema para o estudante estrangeiro. É que o standard English nem sempre reflete o idioma cotidiano do falante nativo, quer na gramática, quer na pronúncia, o que coloca o estrangeiro na estranha posição de conhecer as regras, mas, após anos de estudo, continuar se sentindo um alienígena quando exposto ao idioma falado na rua.
Esse dilema já foi amplamente demonstrado pelo linguista Noam Chomsky. Ele provou que você pode falar da forma mais “correta” e perder o espírito da fala: a comunicação. Por outro lado, você pode assassinar todas as regras gramaticais e comunicar-se maravilhosamente bem. E dá o famoso exemplo em que a perfeição gramatical leva a um perfeito zero em significado: Colorless green ideas sleep furiously (ideias verdes sem cor dormem furiosamente).
O texto acima faz parte do livro Once Upon a Time um Inglês… A história, os truques e os tiques do idioma mais falado do planeta escrito por John D. Godinho. Adquira essa obra nos seguintes endereços: |
O certo e o errado no inglês: as divergências
O certo e o errado no inglês: ascensão dos gramáticos
O certo e o errado no inglês: preconceitos linguísticos em ação
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